Pelas estradas do êxodo com Scalabrini

19.11.2022
Igreja-Fé, Testemunhos de vida

Como aconteceu meu primeiro contato com o mundo scalabriniano e com a figura do Bem-aventurado João Batista Scalabrini?

Respondendo a esta pergunta sinto muita gratidão por todas as pessoas que com seu testemunho me transmitiram, desde o começo, e continuam a me transmitir, o carisma scalabriniano vivo e tão atual para nossa vida de Missionárias Seculares Scalabrinianas.

Eu sou alemã e venho de Ingolstadt, uma cidade perto de Monique, na Bavária.

 

Anos atrás, participei de uma jornada formativa na Diocese de Rottemburg-Stuttgart. Naquele tempo não era frequente encontrar naqueles ambientes pessoas de outras nacionalidades mas daquela vez, entre os presentes, uma pessoa não era alemã: era uma missionária secular scalabriniana. Nos conhecemos e ela me convidou para ir a um encontro internacional para jovens no Centro di Spiritualità dos missionários scalabrinianos em Stuttgart.

Era um encontro de alguns dias durante a Páscoa e eu compareci. Mas o que ficou daqueles dias e o que me fascinou?

Antes de tudo, a profundidade e a comunhão com a qual vivemos entre pessoas de línguas e histórias tão diferentes, junto à acolhida e à simplicidade do missionário scalabriniano que conduzia as jornadas, padre Gabriele Bortolamai. Permaneceu no meu coração o encontro com os migrantes que vivem à sombra das nossas lindas cidades: abri meus olhos sobre a pobreza presente no meu país e, ao mesmo tempo, sobre a generosidade e a capacidade de sacrifício daquelas pessoas, e sobre a riqueza que possuiam. Já na noite de Páscoa descobri um Deus que é Pai, Pai de todos e que me perguntava: “Você me ama de verdade?” (cf. Jo 21, 15).

Porém eu não estava preparada para dizer um sim, para deixar tudo e me confiar totalmente a Ele. Mesmo sentindo sua pergunta queimar dentro de mim, respondi “não” e parti.

Fui longe, em Israel, para um ano de estágio em pedagogia social em uma escola árabe para jovens refugiados palestinos. Ao mesmo tempo continuava os estudos de teologia. O capítulo daquela Páscoa já estava fechado. Tinha me lançado na vida social e colaborava com diferentes grupos políticos de esquerda. Tinha muitos compromissos e mil sonhos para o futuro.

Não faltavam possibilidades, mas eu queria fazer alguma coisa contra a injustiça que via presente em todos os lugares do mundo. Procurava pessoas autênticas e alguma coisa que desse sentido para minha vida.

Hoje, com o olhar retrospectivo, descubro que dois bispos me acompanharam nesta busca - mesmo que eu, como boa alemã, não tivesse muita simpatia pelos bispos. O primeiro deles é o Bem-aventurado J. B Scalabrini. O outro é São Oscar Romero, morto mártir em El Salvador. Quando soube de sua morte, surgiram em mim profundos questionamentos: como pode alguém dar sua vida assim?

Depois se apresentou para mim a ocasião de passar um ano no Brasil, graças a um intercâmbio com uma comunidade de base em uma favela no Nordeste. Parti.

Vida e morte, violência e fome eram eventos cotidianos. Contudo, eu tocava com minhas mãos uma esperança ilimitada, uma fé simples e autêntica. Foi um ano que me marcou profundamente e que transformou minha vida: o ano no qual encontrei de perto o Cristo crucificado e ressuscitado nos pobres e em mim mesma.

Durante o estágio no Brasil fui também a São Paulo. Queria conhecer alguns projetos nos quais estavam envolvidas pessoas mais pobres: crianças em situação de rua, migrantes internos do Nordeste...

Bem naquele dia, se celebrava o dia do migrante e um desfile de pessoas mais pobres e pequenas passava com cantos e cartazes entre as moradias mais miseráveis e os prédios do centro da cidade. Quem eu vi caminhar com eles? Algumas missionárias seculares scalabrinianas. Tinham se passado sete anos do primeiro encontro na Alemanha: não esperava encontrá-las aqui. Permaneci três dias com elas e me senti em casa naquele pequeno apartamento no meio dos cortiços: uma presença muito pequena como uma gota no oceano. As missionárias não eram as mesmas que tinha conhecido em Stuttgart, mas bem alí, do outro lado do oceano, encontrei a mesma comunidade. Isto me impressionou. Mesmo que o ambiente fosse diferente, o coração era o mesmo. O encontro com elas me marcou profundamente, mas depois daqueles três dias renovei meu “não” e parti para Foz do Iguaçu.

Em Foz, sozinha, estava visitando a igreja de São Miguel, quando de repente, quem vejo na minha frente? Scalabrini! Sua imagem sobre um grande cartaz. De novo não esperava por isto! Aproximei-me e falei: “o que você quer de mim?”.

Logo depois se apresentou o pároco. Percebendo que eu era alemã me disse: “Sou um missionário scalabriniano e tenho um irmão missionário na Alemanha, em Stuttgart!”. Nem tinha começado a conhecê-lo e Scalabrini já brincava comigo! O pároco de Foz era irmão de padre Gabriele que citei no início.

Antes de voltar para a Europa fui mais uma vez a São Paulo e permaneci duas semanas com as missionárias para conhecer melhor sua vida e o carisma scalabriniano. O que ficou marcado em mim daqueles dias? A paixão incansável pelos migrantes, paixão que se expressava não só como primeira acolhida, mas também como sensibilização para chegar aos pontos cruciais da sociedade, lá onde se tomam as decisões e como presença “ponte” entre ricos e pobres, entre os migrantes da primeira hora e os indocumentados de hoje.

Outro aspecto da espiritualidade do êxodo, scalabriniana, que me fascinava, era o ”como” vinham lidos os acontecimentos, muitas vezes chocantes, de cada dia: não somente se via o problema, mas também as chances, reconhecendo nas desavenças da história humana e cotidiana as dores de um parto. Além disso, gostava da essencialidade no modo de viver e da criatividade ao enfrentar situações novas e imprevistas, mas sobretudo a centralidade de Cristo na vida e no cotidiano.

Aquelas missionárias, que eu acompanhava durante o dia nas barracas, nas famílias, nos escritórios; as encontrava à noite em silêncio na frente da Eucaristia. Desde o começo tinha me perguntado: de onde recebiam a força e a alegria? Naquele momento descobri a resposta.

Era um dos últimos dias em São Paulo e me encontrava na Catedral da Sé para a missa comemorativa pelo aniversário da morte do Bispo Oscar Romero. A igreja estava lotada de pessoas mais pobres. No momento da coleta das oferendas percebi que a mulher idosa que estava bem na minha frente, descalça e vestida de trapos, ia em frente para levar sua oferta. E me perguntei: “E você, o que oferece?”.

Ali entendi que Deus queria mais do que as minhas mãos, do meu empenho social: queria tudo de mim para poder me dar tudo. Então eu disse sim – um “sim” que mudou completamente meus projetos.

Alguns meses depois começou para mim um tempo da formação para me preparar à vida missionária scalabriniana com os votos de pobreza, castidade e obediência, celebrados em Piacenza no ano de 1994. Um dos aspéctos que colhi naqueles primeiros anos foi a gratidão para com os missionários scalabrinianos, por meio dos quais nós missionárias conhecemos Scalabrini.

E Scalabrini continuou a brincar comigo, na minha vida cotidiana. Por exemplo, nos anos do meu envio missionário em Roma, junto com as outras missionárias, procuramos um novo apartamento e, quando o encontramos, descobrimos que da cozinha se podia ter acesso a uma pequena varanda com uma janela que dava sobre o altar da igreja que estava ao lado da casa.

Como não pensar em Scalabrini e em sua paixão pela Eucaristia, fermento escondido de toda sua vida, atuação e da sua esperança?     

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